Quando era pequenina tinha muitos sonhos.
Quis ser professora para ensinar os meninos que, como eu,
queriam aprender a ler e a escrever e saber coisas giras sobre o mundo que nos
rodeia. Fui-me apercebendo que não era esse o meu destino porque me zangava
muito com os meus alunos (os meus bonecos) e comecei a receber algumas queixas
dos “encarregados de educação”.
Cheguei a ponderar a hipótese de ser advogada. Achava que as
advogadas para além de “chiquérrimas” tinham um poder de argumentação
fantástico e eram pessoas cheias de garra. No entanto, comecei a ouvir que não
era uma vida muito fácil e a perceber que poderia haver alturas em que teria
que defender quem não tinha defesa possível e que a Justiça é muitas vezes
cega... Por isso deixei o “chiqué” de lado e comecei a pensar em coisas
práticas.
Gestão!! É isso... Gestão!! Contas sempre foi o meu forte.
Números. Planeamento... Tanta coisa que eu poderia fazer se enveredasse por
esse caminho. Escolhi a área de Gestão Turística para poder juntar um outro
sonho: ser proprietária de um hotel ou de um Turismo de Habitação numa terra escondida
por aí.
Fiz o meu percurso académico numa faculdade privada embora o
meu sonho fosse a Escola de Hotelaria do Estoril. Por uma milésima não entrei.
Por uma milésima... Enfim, não estava destinado certamente.
Tive grandes professores que me ensinaram muitas coisas. Não
só o que vinha nos livros mas, principalmente, a preparação para uma vida de
trabalho e sacrifício Uma vida de privações mas também de muitas
gratificações. Estudar Turismo surgiu como (mais) uma opção mas tornou-se um
modo de vida. Lembro-me de ouvir alguns comentários de que estudar Turismo era
fácil, que quem ia para Turismo queria era passear e pouco estudar. Não podiam
estar mais longe da verdade. Quem segue esta área tem que estar preparado para abdicar
de muita coisa:
- Os ordenados são quase sempre tabelados e quem trabalha
realmente é quem está nos degraus mais baixos da tabela (salvo algumas
excepções, como é óbvio!). Temos que estar preparados para receber um sorriso
como a melhor gratificação e complemento do ordenado. “Quem corre por gosto não
cansa” deve ser o lema de vida.
- Os horários são incertos: trabalhar por turnos, ser
mãe/pai por turnos, ser esposa/marido por turnos, ter vida social por turnos.
Mas, mesmo com estes sacrifícios o sentido de dever cumprido ajuda a superar
alguns dias menos bons.
- Quem trabalha em Turismo nem sempre tira férias no Verão
pois é quando há mais movimento. Quem trabalha em Turismo nem sempre está com a família na ceia de Natal ou no aniversário dos filhos. Quem trabalha em Turismo
quase nunca faz planos a longo prazo...
- Quem trabalha numa
recepção de um hotel (como eu já trabalhei) lida com muita gente diferente e a
todos eles deverá dar a sua maior atenção e perceber como poderá transformar a
sua estadia numa experiência única. E, pelo menos para mim, a melhor recompensa
é ver sair um cliente da porta do hotel e ter a plena certeza que regressará
porque o serviço foi de excelência.
- Mesmo para os que trabalham como guias ou motoristas de
Turismo, desenganem-se que eles “andam no passeio”. Não há tempo para voltas de
lazer pois o dia todo é uma constante descarga de adrenalina: há sempre visitas
a confirmar, restaurantes a contactar, ver se ninguém fica para trás e etc e
tal. E depois, chegar à noite e tratar do check in no hotel, verificar se todos
têm quarto, ir para os programas sociais do grupo quando o que mais apetece é
enfiar na cama e “apagar”. Mas ainda há que preparar o dia seguinte, e acordar
primeiro que todos, e garantir que não fica nenhuma mala para trás, ou pessoas,
ou passaportes, ou...
Há 3 anos que estou afastada deste ramo pois a vida levou-me
por outros caminhos, outras aventuras, mas só Deus sabe as saudades que tenho
desta “canseira” e desta adrenalina.
Eu continuo a ter sonhos mas muitas vezes penso que, tendo
em conta a difícil fase que atravessamos, cada vez eles estão mais longe de se
concretizarem. Mas vou continuar a tê-los e a refiná-los, quem sabe um dia...
Sabem as célebres frases que fazem nas entrevistas de
empregos “Quem é você?” e “Onde pensa estar daqui a 5 anos?”. A resposta é
apenas esta: Esta sou eu e infelizmente apenas faço planos para daqui a 5 dias.
O meu maior sonho? Arranjar um trabalho”.